sexta-feira, 4 de junho de 2021

Mestre Jakaré do Cavaco - Lembranças do seu primeiro professor de violão, o Mestre Codó

Jakaré do Cavaco, ou Bebeto, como conhecido na família Codó, é carioca do bairro da Glória, nascido em 1958, teve em sua infância um importante contato com Codó, que foi seu primeiro Mestre de violão.

Codó chega com a família no Rio de Janeiro nos anos 60, morado em um apartamento na Rua Santo Amaro, no bairro da Glória, local que era muito frequentada por artistas e intelectuais da época, que vinham prestigiar a música do mestre Codó da Bahia, como relata Jakaré.

Jakaré conta como conheceu Codó e como era o amanhecer de Codó visto por ele, o menino Bebeto de 6 anos de idade, que morava em frente à casa de Codó.

Todo dia por volta das 6:00 horas da manhã, Codó pegava seu violão Di Giorgio e ia para a varanda. Lá limpava o violão com zelo, passava óleo de peroba e o deixava por alguns minutos no sol fraco da manhã (- para ficar igual “casquinha de ovo”), tudo isso antes de começar a dedilhar.

Codó sempre tinha esse ritual, ao amanhecer em sua varanda na Rua Santo Amaro 196, apartamento 102, limpava e dedilhava o seu violão ao sol da manhã.

Assim, encantado pelo violão de Codó, o menino Bebeto pede um violão ao pai e diz que terá aulas com Codó. E o próprio menino vai até Codó, sem saber da história do já consagrado Mestre Codó, e pede para que ele lhe ensine a tocar violão. Codó então o recebe como aluno e amigo da família.

O menino Bebeto, teve como primeiro professor de violão o Mestre Codó. Por vezes, na ausência do mestre pelos diferentes compromissos profissionais, tomava lições do instrumento com os filhos de Codó, Carlinhos (um dos mais velhos) e Leninha (filha do meio entre as mulheres).

Conta Mestre Jakaré: - Nalvinha, a filha mais nova de Codó, mais nova que eu, gostava de cantar. Mercês, que era mais velha, já acompanhava Codó em coro em alguns saraus ocorridos em casa. Leninha, filha do meio, tocava violão e jogava Capoeira e foi com ela que tive meu primeiro contato com a Capoeira. Foi Leninha que me ensinou a ginga e alguns outros movimentos da capoeira, inclusive a tradicional negativa, que na época ainda era feita com o joelho para cima.

Em reunião ocorrida na casa de Codó, em comemoração à vinda do Grupo Folclórico da Bahia ao Rio de Janeiro, estavam presentes Mestre Bimba, Mestre Acordeom, Mestre Preguiça, Mestre Itapuã, Mestre Camisa Roxa e Mãe Zefa de Obaluaiê (personagem integrante do Grupo Folclórico da Bahia, esta na época com 102 anos) e o menino Bebeto (Jakaré) com 8 anos de idade.

Também lembra o Jakaré, que Codó costumava se apresentar com frequência na famosa “Taberna da Glória” (entre os anos de 64 e princípio dos anos 70), famoso reduto da boemia carioca, situada no antigo Largo da Glória, entre Rua Antônio Mendes Campos e a Rua do Catete, frequentada pelos principais músicos do cenário carioca dos anos 60.

A Taberna da Glória recebia músicos como Clementina de Jesus (descoberta por Hermínio Bello de Carvalho na Taberna da Glória, durante a tradicional festa da Glória), Elizeth Cardoso, Hermínio Bello de Carvalho, Pixinguinha, Nelson Cavaquinho, Paulinho da Viola, Elton Medeiros, Zé Keti, Ciro Monteiro, Pedro Nava, Moacir Werneck, Zé Bento, Cartola, entre outros artistas, escritores e jornalistas, como Sérgio Cabral, Mário de Andrade e Carlos Drummond de Andrade.

Jakaré também lembra que costumava ir à praia e jogar bola com frequência com os filhos de Codó, Paulo, Sivaldo e Esteves.

- Com a mudança de Codó e sua família para Niterói, perdi o contato com o pessoal, apesar de ter ido visitar eles já morando em Niterói. Depois disso, parei um pouco com o violão, mas com cerca de 16 anos de idade, retomei o violão, aprendi o cavaquinho e ingressei de vez na Capoeira.


Sobre o Mestre Jakaré do Cavaco

Músico e capoeirista carioca, nascido no bairro da Glória, no Rio de Janeiro na fase de formação dos primeiros movimentos de capoeira ditos organizados no Rio, esteve presente no primeiro Encontro Brasileiro de Capoeira em 1984 no Circo Voador. Participou também em 1987, do 2º Festival de Cantigas de Roda, onde foi premiado por duas de suas canções, “Amante da Liberdade” e “Cinco Séculos”.

Mestre Jakaré, residente em Paris, desenvolve desde 1988 trabalhos com Capoeira e Música Popular Brasileira na Europa.

Destacando-se como importante entusiasta na inclusão de diferentes elementos da cultura brasileira no universo da Capoeira, sobre a visão de que para aprender Capoeira a pessoa precisa conhecer o Brasil, sua história e sua cultura. Sendo hoje importante referência para diferentes gerações de capoeiristas e músicos.

- Como alguém vai aprender Capoeira sem conhecer o Brasil, a cultura Brasileira de maneira geral e a sua língua?

Nos anos 80 haviam poucos mestres de Capoeira na Europa, entretanto, os que lá estavam vinham de diferentes lugares do Brasil e traziam referência folclóricas, musicais e culturais de sua região de origem.

Lembra o mestre que, a Capoeira até os anos 80 era muito fechada, mais focada corpo, mais voltada para luta e preparo físico. E com características culturais somente da região da Bahia.

Indo morar na Europa, inseriu o cavaquinho, o samba, partido alto e forró. E incentivava que outros capoeiristas também inserissem ao contexto da Capoeira a musicalidade da sua região, como o frevo, maracatu, samba-reggae e outros elementos de sua cultura brasileira regional. 

- Com isso começa a surgir o que vemos hoje, onde a Capoeira é abordada de forma mais ampla, representando a arte de um povo, e nela contidas além da técnica, a cultura, espiritualidade, ancestralidade e conceitos de resistência racial.

- Eu conheci o Brasil morando no exterior, onde tive contato com brasileiros de todos os estados. Lá fizemos uma grande comunidade de brasileiros, diversidade cultural, todos muito unidos e somando culturas, um caldeirão cultural.

Em sua trajetória Mestre Jakaré do Cavaco desenvolveu amplo trabalho no meio acadêmico, lecionando Capoeira em escolas públicas e privadas, atuando do maternal a universidades, com importantes trabalhos na realizados na educação infantil, de jovens e adultos.


Rio de Janeiro, 02 de maio de 2021.

Por Mauricio Brito.


Canal Jakeré do Cavaco no YouTube: https://www.youtube.com/user/jakaredocavaco