sábado, 13 de dezembro de 2014

MESTRE CODÓ e seu violão mágico - Revista Fatos e Fotos 1974



MESTRE CODÓ  e seu violão mágico
(Matéria extraída da Revista Fatos e Fotos, 1974)

Depois da longa ausência, ele volta aos palcos acompanhando Ismael Silva e Carmem Costa, no show "Se Você Jurar"

            "Ele estava completando 12 anos quando compôs Sereia, sua primeira música, munido de um violão fabricado por suas próprias mãos. O corpo do instrumento fora feito de um caixote e as cordas eram de piaçava. Seu nome: Clodoaldo Brito, o Mestre Codó da Bahia".

            Clodoaldo Brito, o mestre Codó da Bahia, é considerado o maior solista brasileiro, tendo influenciado toda geração de músicos, como Baden Powell, João Gilberto e Rosinha de Valença.

            Baiano, nasceu no Arraial de Cairu de Salinas das Margaridas, mas sua formação musical vem de Salvador, onde viveu 35 anos. Em 1964, mudou-se para o Rio com a família, e nesse mesmo ano gravou seu primeiro LP, Alma do mar no Violão de Codó.

            Filho de pescador, aprendeu com o pai a "arte da pescaria" para ajudar nas despesas. Mas ele era vidrado mesmo em música. Todas as noites ia "bater" violão nas rodas de bambas da Ladeira do Pelourinho, em Salvador, e já era respeitado pelos capoeiristas, que viam nele um menino prodígio do samba e da malandragem.

            Aos 12 anos fez seu primeiro violão improvisado. Dinheiro para comprar um era coisa que não tinha e a solução foi pegar um caixote de querosene, dar-lhe formato e acrescentar cordas de piaçava. Com este instrumento rudimentar, sem jamais ter tido um professor, Mestre Codó compôs várias de suas músicas.

            - Entrava com meu violão de querosene mar a dentro e ficava tocando enquanto esperava o peixe.

            Uma vez tive uma visão: apareceu uma mulher linda na esteira que o luar formava no mar. Ela parecia viva e sua expressão era de agrado. Foi assim que fiz Sereia, minha primeira música. Saiu alí mesmo, na hora, dentro do barco.

JOÃO GILBERTO, O FÃ ARDOROSO

            Mais tarde, começou a trabalhar nas rádios de salvador. Como ele mesmo diz, "troquei as cordas da rede de pescar pelas cordas do violão". Organizou uma orquestra, fundou a Rádio Clube de salvador e a Rádio Sociedade da Bahia.

            Nessa época, Codó já tinha um fã ardoroso; João Gilberto, que não perdia uma de suas apresentações na Rádio Sociedade da Bahia. No final saíam os dois à procura de um bar onde pudessem tomar umas cervejinhas e conversar sobre música.

            Em agosto de 1951, ele já era um nome conhecido internacionalmente; Vanja Orice gravou Zum  Zum Zum na França e mais tarde, Doum, Donato e Sérgio Mendes gravaram suas músicas nos Estados unidos e no Japão. No Brasil, Jorge Ben gravou Tim Dom Dom e Nara Leão, Zum Zum Zum.


CARMEM COSTA E ISMAEL SILVA CONSIDERAM-NO O MAIOR SOLISTA DO BRASIL  


Codó e Carmem Costa, 1974.
            Atualmente, Mestre Codó está no teatro Senac, no Rio, acompanhando ao violão Ismael Silva e Carmem Costa, no show "Se Você Jurar", escrito, dirigido e narrado por Ricardo Cravo Abin. Antes da estréia no Rio, o espetáculo foi apresentado em Curitiba, e em São Paulo, com sucesso absoluto e criticas favoráveis da imprensa paulista, o que muito emocionou o mestre.

            - Só vendo, menina, o público era jovem, todo mundo entendendo e gostando da gente. solei Lamento e carinhoso, de Pixinguinha, e Feitiço da Vila, de Noel Rosa. As pessoas aplaudiram tanto que eu tive que me segurar pra não sair da linha. No final ele pediram Abismo de Rosas e Asa Branca. O primeiro foi tranqüilo, já gravei antes, mas o segundo, não. Eu nem tinha tocado Asa Branca em público. Aí eu expliquei que a coisa teria que ser na base do improviso. E foi. Saiu tudo muito certo, muito bom, Impressionante, nunca vi nada igual.

Codó e Ismael Silva, 1974.
            E no Rio, o show repete o sucesso. O espetáculo conta a vida de Ismael Silva e Carmem Costa, em seus quase 50 anos dedicados ao samba. No final, o público pede bis e todos saem sorrindo satisfeitos do teatro. Codó sola as mesmas músicas e é aplaudido de maneira emocionante. Codozinho, seu filho, o acompanha no show.

            Codó hoje, aos 60 anos, transa o dia inteiro com seu Di Giorgio debaixo do braço: "Não troco este violão por fortuna nenhuma. Afinal, é ele que vem sustentando minha família já a muitos anos."
            E a família é bem numerosa: casado com Dona Antonina, há 32 anos - que acorda todos os dias ouvindo o LP Codó Brincando Com as Cordas - ele é pai de nove filhos, todos baianos. E todos tocam e compõem: "Até Esteves, meu caçula de 11 anos, já sola Abismo de Rosas."

Codó e seus muitos violões em seu apartamento no Estácio RJ, 1974.
            Em seu apartamento no Estácio, o assunto é sempre música. Um mostra seu trabalho a outro ou pede uma sugestão sobre este ou aquele acorde. Na sala, há mais de seis violões espalhados pelos cantos, gavetas abarrotadas de partituras e, em cima da televisão, os troféus que Codó ganhou nos festivais de Jurujuba, em Niterói.

            Carlinhos, de 23 anos, mostra um frevo que compôs e que gostaria que Gal Costa gravasse; Esteves faz seus exercícios escolares nas costas do violão.


ELE VAI ABRIR O CANTINHO DO CODÓ

            Com seis LPs gravados e mais de 500 músicas inéditas, o mestre afirma que ainda não teve oportunidade para mostrar todo o seu trabalho, "porque as gravadoras preferem músicas conhecidas como garantia de sucesso". Mas se tudo der certo, como estou planejando, vou abrir o "Cantinho do Codó, um recinto de diversão, bem retirado da cidade. Talvez na Barra, para receber os amigos, tomar umas cervejinhas e tocar meu violão. Por enquanto, isso é só um sonho, porque não ganho dinheiro suficiente e a loteria vive fugindo de mim".
Matéria presente na revista Fatos e Fotos, 21 de maio de 1974.

Fonte: Revista Fatos e Fotos, 21 de maio de 1974.